terça-feira, 30 de março de 2010

O Jardim do Príncipe

Me roubaram a flor. Do perfume eu só sinto um acorde... Me trouxeram torpor, e um beijo velho ainda arde. Ria ó flor, do orvalho que te faz cócegas. Ria da dor, pois a poda, se deixarem que escolhas, enfeitará o quarto do Príncipe. Arrancam teus espinhos, ó flor, não para não te machucares, mas para que não os machuquem; Podam tuas folhas, ó flor, por pura vaidade, não para cresceres mais forte, mas para seres bela. Tratam tua terra, ó flor, não para dizer que te amam, mas para te conformares e acomodares por perto sempre. Mas, no fim, a poda engrandece-te, os espinhos fortalecem-te, e tu, flor, é transplantada para solos mais férteis: o jardim do Príncipe.

sábado, 27 de março de 2010

A maçã

O que agora não me escorre às mãos me escorre aos olhos, e a maçã mordida parece, agora, muito mais suculenta, só depois de mordida, mais disforme e livre para ser maçã mordida mais de uma vez, mas mais do que isso, agora exala parecer que é maçã, agora, só depois de mordida, o fruto vermelho encarnado, inquebrável, envolto em seu próprio estirpe, que é só dele. E na necessidade de ser maçã, outros olhares atravessam sua superfície lisa, vermelha esmaltada, que conservam a incredulidade do resto do mundo, para ver a poupa aguada onde se cravam os dentes, através da casca, quando só esses olhares acreditam, outros olhares... a maçã é algo transparente agora, é algo. Depois de quebrado o feitiço, o encanto, se deliciou no músculo estranho, no espaço oco que também era nada antes dela, e assim, termina triturada como parte de alguém.

19/06/2008 às 11:10h

segunda-feira, 22 de março de 2010

Não tem nome...

Dou-te então esses versos cheios de mim
Hoje eu cansei de ser-te
Por isso digo meus...

Tome esses braços laços
Que te escreviam para sempre
E esse pudor que a ti pertence
Hoje eu cansei de ser-te
Por isso digo seus

Joga-te fora de mim
Soa música com o vento
Longe, e só

Por que água salgada dos meus olhos cai?
Por que sorriso vertente agora se esvai?
Me dói a palma das mãos
E não consigo segurar pa - la - vras . . .

05/11/2007

sábado, 13 de março de 2010

Sensibilidade

Deixa-se, ao final da tarde, o Sol entrar no quarto pela fresta da porta da varanda sem se perceber. Ele faz um contraste incrível de sombra e luz em cada objeto que toca, mas não se percebe. Passa-se por flores e nem se sente o perfume, e cada pétala tem uma textura aveludada que daria prazer tocar. Há muita beleza em toda parte, mas cada um busca a própria. Minusculamente nascem vidas, nascem flores, mas há grande ocupação. Maximamente vidas se acabam, mas há grande ocupação. Perde-se junto a pureza do toque, o turbilhão que há no olhar, o significado dos gestos... pois há grande ocupação.

quinta-feira, 11 de março de 2010

Coração de vidro

Coração de vidro não quebra. Ele me deu um coração de vidro. Casou-se comigo e me deu o seu. Mandou-me num envelope branco o símbolo. Disse que é transparente e inquebrável. Disse que tem ouro, que é resistente, que tem prata, que reluz. Veio até com um suposto preço... Acertou na caixa e na cor. As cores da prata e do ouro se misturam lá dentro, até me confundo tentando procurar um desenho. Mas é assim, nada é tão perfeitamente lapidado quanto se pensa. O coração quebrou, o vidro não era tão translucido, o ouro e prata, purpurina. Foi assim que ele me deu seu coração.

quarta-feira, 10 de março de 2010

oãnadnia

Hoje eu pintei de negro as paredes do meu quarto, o riso estancou. Diria que está em preto e branco, mas não, preto e branco é uma combinação muito mórbida para o que já foi puro riso... é mesmo um colorido desbotado, cores vivas que não mais se vê a olho nu. Eu havia pensado: "Será que é agora? Acabou?", mas me privei de pensar, pra não escrevê-lo, não acreditá-lo... medo, é o medo de se deixar ouvir. Ser ouvido por si mesmo dá uma sensação de poder esquisita, e o poder, esse poder de se mandar e se obedecer, faria toda a ideologia sumir, mas por que se é tão cômodo? Então agora, mesmo sabendo, eu me respondo que "ainda não", mas pinto de negro as paredes do meu quarto.